Onde limite é a virgula e não o ponto.
Insetos
17/08/2013 18:27Como inseto que sou,
Não tenho pés para pisar,
Mãos para executar,
Nem cérebro para maquinar
Não preciso ser grandioso como tu
A beleza é a razão eterna do meu sopro
Suspiro fragmentos de sementes aéreas, Dente de Leão
Germinando esperança em flores
Polinizando amor...
Faço Aurora repetida; dia a dia que começa
Meu corpo, matriz das matizes
Minha alma, ama do espírito
Consciência plena, movimento da vida
Quando ovo,
Fui gema protegida em casca,
Casa confortada em clara...
(Luz que sempre vi como promessa divina)
Levitei feliz...
Sem necessidade de entendimento,
Imune ao mundo,
Incorporando o Ser,
Encorpando
Tudo... Todo o saber residindo no germe
Recordo em sofrimento,
Tão traumatizante que foi a eclosão
Que me separou da origem
Lagarta eu,
Sobrevivi às intempéries, aos predadores, a mim mesma...
Nesta fase fui só expectativa
Ao encalço de folhas carcomidas
Em sentidos poucos...
Mal via,
Mal ouvia,
Mal dizia,
Tateando a minha procura
No reflexo de outras larvas
Parte da minha casta sobrevive aqui
Perece aqui, rastejando...
Um dia, me desequilibrei,
O que Hera já não podia mais...
Foi chamamento natural,
Dos raios de sol
Aquecendo as entranhas
Aquiescendo com o destino
Do som do farfalhar
Consonante com o tom do meu coração
Pulsando em ritmo de pupa
Em circulação transformadora
Estático em ninfa
Tive coragem para envolver-me
Depois desenvolver-me
Casulo que foi meu novo ventre
Adormecendo o corpo gelatinoso
Em clara luz própria
Banhando o feto em vontade
Foi concepção de mim mesma
Com maternidade da Alma
E paternidade Divina
Ninfa eu, noivando com a árvore
Integrada com a floresta
Profetizada em ramos
A prima primavera
Florescendo em todos
Na árvore, na floresta e em mim
Foi um alvorecer austral em setembro
Estação inevitável
Com aroma de grama molhada
Pássaros anunciaram a minha chegada
Sol sustenido que mais uma vez me iluminou
Mesma floresta,
Mesmo planeta,
Mesmo universo,
Uma única música,
Soando diferente aos ouvidos de cada Ser
Sussurrando segredos a quem pode ouvir
Outro dia fui feto
Protegido em ovo
Outro dia lagarta
Nos braços da árvore
Outro dia... E mais um
Aqui estou, preludio de melodia
Perfeita por mim mesma
Fiz todo o sentido,
Nos sentidos que despertaram...
Nas fundamentais antenas,
Usadas para captar a essência do vento,
O aroma doce do néctar;
Alimento do Ser que é vivo
Sou eu....
A própria poética em asas
Tão frágil quanto as palavras são...
Tão duradoura quanto os sonhos
Um dia, devorei folhas e flores
Neste dia, escrevo flores em folhas
Feiticeira que sou
Texto: Maurício Gervazoni
Imagem: Jonathan Ducruix - Human Methamorphosis -
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