Onde limite é a virgula e não o ponto.


<< Julieta Apunhalou-se >>

30/10/2013 22:12

 

Fui assistir-te em recente peça e ressenti

Nostalgia daquela mulher que atuavas

Não desta aí, cortesã inerte travestida de ti

Lembrei-me então do cenário que te amava

E das criações sublimes que encenavas

 

Certa vez, já esteve hesitante atriz na estreia...

Derramando versos excitantes em lábios de sereia

No batom das palavras que pintavam tua boca,

Desfilava o sumo dos teus adjetivos no meu palco

O texto por ti beijado convertia qualquer contexto em canto

 

Ah! Que tu ias moçoila graciosa pautando a cadência

Jovem ou ancião, todos valsavam tua pretérita essência...

E cada personagem atuado, foi tatuado em fragrância única...

Em toadas que aromatizavam o teatro na suave música...

A plateia agraciada, pela mágica braçada de uma fada

 

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Sim!

Foi o maior amor de todos os tempos que representavas;

Belas-letras desperdiçadas, envenenadas...

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A onde está, teu feminil perfume ancestral?

Foram nas gotas dele que forjou perfumes diversos

Aquelas ecléticas personas; águas de colônia

Oh! Deus... Deste fim ao teu óleo essencial

Derramaste a Dama olência sem parcimônia

 

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Não!

Não foram eles os Montecchios que te privaram deste amor...

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A procura pela imagem perfeita sequestrou-te a estória

A adoração do torso suprimiu-te a alma

Evanescendo o conteúdo volátil em chama

Vi em ti, triste atriz denegrindo bela memória...

Interpretaste uma Capuleto em libreto, sem o mínimo afeto...

 

Efeito da partida de ti, quando alienaste o corpo na plástica

Enrijecendo-te as frases e a crônica...

Exaurindo o olor desta gordura em busca esteta,

Tornaste-te uma insossa opereta

Uma musa sem acústica na escultura dura que te cela

 

E com esta esquelética silhueta,

Como pudeste interpretar Julieta?

Na tua preocupação sintética com a dieta,

Suspendeste a artista entre estética mente estática

Agora, onde está “Ela” pendida na menina cerâmica?

 

Emigraste a tua Diva para outro lugar... Em triste êxodo...

E nesta arrependida divisão, tu ficaste em dívida...

Nas sobras de ti, a beldade em rígida campa um engodo

Uma boneca de porcelana subsistindo maquiada

Pintando esconderijo frágil em uma pele esticada

 

A tez em falso brilhante é diamante citrino...

E naquele sorriso cadafalso que racha,

A luz da audiência é enforcada sem destino...

Teu interior magérrimo, negra gargantilha

A obra antes magnífica, uma bijuteria arruinada...

 

E teu doce partindo, vai indo de Aspartame...

Irás ser sem demora fantasma adoçante em Senhora

Sem Partido que a acompanhe sequer lágrima derrame

Ludibriada por Romeus inorgânicos, sem veneno nem sal

Tua falta de açúcar suprimida em excesso de soro artificial

 

Na peça encenada tu faltaste com o ardor à dor

E não tiveste nenhum verdor...

Nem pudor debutante escondido nas anáguas

Teu Romeu foi um cínico derramando vis lágrimas

Coadjuvando falsas águas acrílicas em que nadas

 

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Tuas mortes nunca foram dantes tão desejadas!

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O peito âmago que te latejavas há mulher

É hoje seio silicone ocultando magrém caráter

Um ergástulo erótico que ergueste, cegando-te o alvorecer...

Choro saudades do coração menina pulsando o amanhecer

Sera que á tua Estrela dia brilharei a ver?

 

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Eu resguardo-me da próxima edição de ti...

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Pois que jamais houve história mais dolorosa

Do que esta anunciando o duplo suicídio

(O meu Romeu e o teu “Eu”)

Culpa de tua falsa verdade, quando deveria ser-te puro fingimento...

Culpa de minha credulidade, de que exista hoje qualquer Julieta... 

 

 

Texto: Maurício Gervazoni

Imagem: Google Images

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